O Muro de Berlim e a prisão do comunismo

Por Richard Ebeling
28/06/2023 14:50 Atualizado: 28/06/2023 14:50

Por quase 30 anos, o Muro de Berlim simbolizou a luta entre a democracia ocidental e a tirania comunista. Na sexta-feira, 9 de novembro de 2018, passaram-se quase 30 anos desde que os berlinenses do Oriente e do Ocidente invadiram o Muro de Berlim em 1989, determinados a derrubar essa barreira à liberdade humana.

O Muro de Berlim é um símbolo da clara diferença entre uma sociedade livre na qual as pessoas eram livres para ir e vir como quisessem em paz, e uma sociedade tirânica na qual o regime totalitário imposto pelos soviéticos tinha tanto medo do desejo do povo de fugir que brutalmente fizeram tudo o que podiam para mantê-los prisioneiros dentro das fronteiras do Estado marxista.

Vale a pena lembrar como e por que o Muro de Berlim foi construído e o que significou na grande luta entre liberdade e tirania no desenrolar dos eventos políticos do século XX.

Encerrar as pessoas atrás de uma parede de tirania

Em 10 de agosto de 1961, Nikita S. Khrushchev, primeiro-ministro da União Soviética, assistiu à festa de aniversário em Moscou de Sergei S. Verentsov, o marechal soviético encarregado do programa de mísseis na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Khrushchev relatou na celebração, composta de militares soviéticos e dignatários políticos, que algo importante estava prestes a acontecer.

“Vamos fechar Berlim”, anunciou Khrushchev. “Vamos colocar rolos de arame farpado e o Ocidente vai ficar lá como uma ovelha estúpida. E enquanto eles estiverem lá, nós construiremos um muro”. A multidão explodiu em aplausos calorosos.

A cidade de Berlim foi dividida em quatro zonas de ocupação pelos Aliados no final da Segunda Guerra Mundial na Europa. Metade a leste da cidade era a zona soviética. A metade ocidental foi dividida em zonas norte-americanas, britânicas e francesas, cercadas pela zona de ocupação soviética na Alemanha Oriental.

A zona de ocupação britânica ou norte-americana mais próxima na Alemanha Ocidental ficava a 170 km a oeste. Os soviéticos haviam estabelecido uma “república popular” em sua área — a República Democrática Alemã, com Berlim Oriental como sua capital.

Entre o final dos anos 40 e 1961, mais de 4 milhões de alemães orientais e berlinenses orientais aproveitaram a relativa facilidade para atravessar da zona soviética em Berlim para uma das áreas ocidentais para “votar com os pés” e deixar o “paraíso dos trabalhadores” que Moscou lhes havia imposto. O êxodo em massa foi uma grande vergonha tanto para o governo da Alemanha Oriental quanto para o governo soviético. Também significou uma grande perda de mão-de-obra qualificada e de muitas ocupações profissionais.

Os soviéticos quase conseguiram manter em segredo que Berlim Oriental seria fechada. No sábado, 12 de agosto de 1961, 1.573 alemães orientais cruzaram a linha que separava Berlim Oriental e Ocidental e se registraram como refugiados que queriam morar no Ocidente. Eles foram o último grupo autorizado a sair livremente. Os soviéticos colocaram arame farpado ao longo do Portão de Brandenburgo, de frente para as áreas ocidentais no centro da cidade. E às 2 horas e 3 da manhã de 13 de agosto, a fronteira entre Berlim Oriental e Ocidental foi fechada.

“Sucessos” e “fracassos” do muro

Dois dias depois, em 15 de agosto, começou o trabalho no Muro de Berlim; ele foi feito de tijolos e concreto e levou dois anos para ser concluído. Quando acabaram, ele tinha 45 km de comprimento e quase 3 metros de altura, com arame farpado no topo. Os guardas da Alemanha Oriental, armados com metralhadoras, atiravam em quem tentasse atravessá-lo. Havia também uma área de 180 metros antes do muro, coberta de minas terrestres e patrulhada por cães policiais.

Mesmo assim, apesar de tudo, durante os 28 anos da existência do muro, entre 1961 e 1989, estima-se que 5.000 pessoas conseguiram escapar, seja por cima, por baixo ou através do muro. Alguns escaparam pelo sistema de esgoto sob o muro. Outros cavaram túneis — o mais longo foi de 150 metros de comprimento, através do qual 57 pessoas entraram na Alemanha Ocidental em 1964.

Uma mulher costurou uniformes militares soviéticos para três amigos do sexo masculino, que atravessaram um dos postos de controle do muro com a roupa espremida sob o banco da frente de um carro. Um arqueiro atirou uma flecha com um cabo por sobre o muro a partir de um prédio na Alemanha Oriental e deslizou em direção à liberdade.

Alguns fabricaram balões e máquinas voadoras precárias, usando motores de motocicletas para impulsionar o voo por sobre o muro. Outros nadaram por canais ou rios que separavam partes da Berlim Oriental e Ocidental.

Traficantes de liberdade

Também surgiu um serviço clandestino que publicava anúncios em jornais da Alemanha Ocidental. Uma dessas empresas, a Aramco, com sede em Zurique, na Suíça, enviava comunicados de imprensa anunciando seus “métodos técnicos mais modernos”. Os preços da empresa não eram tão irracionais: de 10 mil a 12 mil dólares por pessoa, com “descontos por quantidade” para famílias, pagáveis através de um número de conta em um banco suíço. Se uma tentativa de fuga falhava, a empresa reembolsava a maior parte do dinheiro ao ocidental que financeiramente apoiava a fuga.

O governo da Alemanha Oriental publicou anúncios de “procura-se” no lado de Berlim Oriental no posto de controle Charlie, oferecendo 500 mil marcos alemães pela cabeça do diretor da Aramco, Hans Ulrich Lenzlinger. Os cartazes referiam-se a ele negativamente como um “comerciante de pessoas”. Em fevereiro de 1979, alguém reivindicou a recompensa pela cabeça de Lenzlinger após ele ser alvejado repetidas vezes no peito e ter morrido em sua casa em Zurique.

Ele não foi a única vítima das tentativas de fuga. Durante esses 28 anos de existência da muralha, 80 pessoas perderam a vida tentando alcançar o lado ocidental. Outras mais de 100 pessoas perderam a vida tentando escapar através de outros pontos da fronteira da Alemanha Oriental fortificada.

Uma das mortes mais desumanas aconteceu em agosto de 1962. Peter Fechter, um pedreiro de 18 anos, foi baleado enquanto tentava escalar o muro. Durante 50 minutos, ele implorou por ajuda enquanto lentamente sangrou até a morte na frente dos soldados e jornalistas que observavam a partir de um dos postos de controle no oeste. Somente depois que ele morreu, os guardas orientais recuperaram o corpo.

O Muro de Berlim passou a simbolizar a Guerra Fria e sua divisão do mundo em duas metades, uma metade ainda relativamente livre e a outra metade mantida sob a mais brutal e abrangente tirania experimentada durante a história moderna. Supunha-se que nada poderia atravessar a Cortina de Ferro de cercas de arame farpado, campos minados e torres de vigia com metralhadoras que atravessavam a Europa Central do Báltico ao Mar Adriático, sem a permissão dos mestres soviéticos em Moscou.

O muro versus o direito de se locomover

O que o Muro de Berlim representou foi a ideia do século 20 do indivíduo como propriedade do Estado. Atrás desse muro, o governo da Alemanha Oriental dizia às pessoas onde morar e trabalhar, que produtos poderiam consumir e que distrações e entretenimentos eram permitidos.

O Estado determinava o que eles podiam ler, olhar e falar. Eles não podiam deixar o país — fosse para fazer uma visita ou para sempre — a menos que servissem aos objetivos e interesses de seus mestres políticos. Se alguém tentasse sair sem permissão, corria o risco de levar um tiro e ser deixado para morrer, sozinho e sem ajuda, enquanto o resto tinha que ficar lá olhando horrorizado.

No século XIX, o grande triunfo do liberalismo clássico tinha sido a abolição da última das antigas restrições ao direito do indivíduo à sua vida, à liberdade e à aquisição honesta de propriedade. Isso incluía o direito das pessoas viajarem livremente sem interferência ou controle do governo.

Em épocas anteriores, não apenas as dificuldades físicas de transporte impediam que o homem se movesse amplamente de uma região ou continente para outro. Junto com as barreiras físicas, havia barreiras legais de impostos, pedágios, passaportes e servidão, que ligavam a vasta maioria do povo à terra possuída pelas castas políticas privilegiadas e detentoras de títulos.

Liberais clássicos e economistas clássicos do início do século XIX promoveram a remoção de tais restrições à liberdade das pessoas. O princípio orientador era que o homem tem o direito de se apropriar de si mesmo, que ele é o dono de si mesmo. Como o economista clássico John R. McCulloch expressou na década de 1820:

“De todas as espécies de propriedade que um homem pode ter, as faculdades de sua mente e os poderes de seu corpo são mais particularmente seus; e é disso que ele deveria poder desfrutar, isto é, usar e exercer, a seu critério, de […] qualquer forma não injurioso para os outros, [como] ele considerar mais benéfico para si mesmo.”

Uma extensão lógica do direito à autopropriedade sobre a mente e o corpo, e seu uso para promover propósitos pessoais e pacíficos, é o direito de se mover para onde se acredita que possa haver melhoras em suas circunstâncias.

No decorrer do século XIX, as várias restrições à liberdade de locomoção foram removidas. Os passaportes foram praticamente eliminados por todos os principais países da Europa e da América do Norte, e as barreiras legais à emigração ou imigração foram quase completamente abolidas nessas mesmas nações.

Dezenas de milhões de pessoas, por conta própria e com financiamento privado, deixaram seus locais de nascimento em busca de melhores condições de vida e fortunas em países e continentes de sua escolha. Cerca de 60 milhões de pessoas aproveitaram a maior liberdade de movimento entre 1840 e 1914, antes do início da Primeira Guerra Mundial. Mais da metade desses 60 milhões chegaram aos Estados Unidos para iniciar uma nova vida em uma sociedade livre.

Barreiras à liberdade

Mas com a chegada da Primeira Guerra Mundial, os governos restauraram o uso do passaporte e outras restrições à liberdade de locomoção. Juntamente com a ascensão das ideologias totalitárias nos anos que se seguiram ao fim da Primeira Guerra Mundial, a liberdade de movimento foi abolida.

O comunismo, o fascismo e o nazismo trabalham sob a premissa de que o indivíduo é subordinado e vive e trabalha apenas para promover os interesses do Estado. Como um “objeto” de propriedade do Estado, o indivíduo permanecia lá ou era removido à força para algum outro lugar sob as ordens brutais da autoridade política.

O economista alemão especialista em livre mercado, Wilhelm Röpke, disse certa vez que:

“O nacionalismo e o coletivismo moderno, por meio da restrição à migração, talvez tenham alcançado o mais próximo do ‘estado servil’ […]. Dificilmente o homem pode ser mais reduzido a uma mera engrenagem na máquina do Estado nacional coletivista como quando ele é privado da liberdade de se locomover […] Ao sentirmos que agora pertencemos a esta nação, de corpo e alma, estaremos mais facilmente sujeitos ao estado obediente de servidão exigido pelos governos nacionalistas e coletivistas.”

Ao celebrarmos o 30º aniversário da queda do Muro de Berlim, devemos lembrar tudo o que ele representou como símbolo da tirania sob a qual o indivíduo foi marcado com o rótulo de “propriedade do Estado”. Ele não só era controlado em tudo o que fazia e dizia publicamente, mas cada movimento seu era observado, comandado ou contido.

Liberdade em todas as suas formas — falar, escrever, se associar e ter uma crença como desejamos; buscar qualquer tipo de ocupação, profissão ou empresa privada que a inclinação e a oportunidade nos sugiram; e visitar, viver e trabalhar onde nossos sonhos e desejos nos levam em busca de uma vida melhor — é uma coisa preciosa.

A história do Muro de Berlim e a ideologia comunista por trás de sua construção deveriam nos lembrar o quanto é dolorosa a perda de qualquer de nossas liberdades à medida que determinamos em que direção — em direção a uma maior liberdade individual e livre iniciativa ou em direção a mais comando e controle governamental — queremos que o nosso país se mova rumo ao século XXI.

Dr. Richard M. Ebeling é um renomado professor de ética e liderança empresarial da Universidade Militar The Citadel, em Charleston, na Carolina do Sul

As opiniões expressas neste artigo são as opiniões do autor e não refletem necessariamente as opiniões do The Epoch Times.

Entre para nosso canal do Telegram

Assista também: