Exclusivo: Policiais Civis de Minas Gerais se mobilizam e retratam a crise vivenciada pela instituição  

 “Ele se orgulha da melhor polícia do país, mas nos trata como escória" diz o diretor executivo do Sindicato dos Policiais Penais de Minas Gerais (Sindppen-MG),

Por Matheus Andrade
23/05/2024 21:07 Atualizado: 04/06/2024 21:06

Leonardo Teles Cruz, diretor executivo do Sindicato dos Policiais Penais de Minas Gerais (Sindppen-MG), anunciou para o Epoch Times Brasil o início de uma mobilização na terça-feira (21),  da polícia civil de algumas cidades de Minas Gerais. De acordo com Teles, a decisão vem em resposta a uma série de reivindicações não atendidas pelo governo estadual.

Leonardo cita a falta de investimento, condições de trabalho inadequadas, efetivo policial insuficiente, desmantelamento da Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG) e a ausência de reajuste salarial compatível com a inflação como alguns dos motivos da mobilização da categoria.

Leonardo, que é policial penal de Minas Gerais e atualmente trabalha como Agente de Segurança Penitenciário, disse ao Epoch Times Brasil que os policiais querem apenas “investimento, cursos, condições de trabalho efetivas.”

Efetivo policial insuficiente

A defasagem no número de profissionais em atividade sobrecarrega os policiais penais, resultando em jornadas exaustivas e aumento do risco de acidentes e doenças ocupacionais.

Os problemas relatados já são conhecidos pela Câmara Legislativa de Minas Gerais. Em julho de 2022, durante uma reunião do Fiscaliza 2022, já havia sido relatado a defasagem em todas as polícias de Minas Gerais, sendo a Polícia Civil a mais afetada. 

“Todas as carreiras da segurança apresentam déficit, mas o da Polícia Civil é maior. Reforço meu pedido para que continuem cobrando do governo as melhorias”, pontuou o deputado estadual Sargento Rodrigues (PL), ao chefe da Polícia Civil de Minas Gerais.

Parte da crítica se deve ao fato de haver pessoas que passaram nos concursos para assumir as vagas, mas que não são nomeados para assumir o cargo. Em resposta, Joaquim Silva, chefe-adjunto da Polícia Civil, disse que estava previsto para aquele ano (2022) a nomeação de 1.451 aprovados em concursos, incluindo 618 excedentes. Ele explicou, porém, que no mesmo ano, 1150 servidores já estavam em condição de aposentadoria.

Dados publicados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que dos 151.019 efetivos previstos para 2023, apenas 95.908 foram preenchidos, isso é cerca de 36,5% de defasagem nos efetivos da Polícia Civil em todo o Brasil. Em Minas Gerais, cerca de 8.957 cargos foram preenchidos dos 16.178 previstos para 2023. 

Atualmente, um servidor da Polícia Civil faz o serviço de 1,8 homem.

(Cortesia de Leonardo Teles Cruz)

Falta de reajuste salarial

A luta por um reajuste salarial compatível com a inflação é uma bandeira antiga de várias categorias. Os policiais penais pedem que o governo cumpra com as promessas feitas em campanhas anteriores e respeite o “direito à reposição inflacionária”, essencial para a manutenção da qualidade de vida dos servidores e de suas famílias. 

Desde julho de 2022, quando atingiu uma deflação de 0,68, a inflação mensal tem subido e em 2024 tem apresentado sinais muito negativos. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) referentes ao mês de abril de 2024, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) do mês de abril subiu de 0,16% para 0,38%.

As projeções do Banco Central para o fim de 2024 mostram que a expectativa, que há 4 semanas estava em 3,73%, subiu para 3,8%. Ainda há aqueles que esperam valores maiores de 4% de aumento nos preços.

De acordo com o diretor do Sindppen, eles estão há mais de sete anos sem recomposição inflacionária nos salários: “[Romeu Zema] não nos dá o direito de recomposição inflacionária, que há mais de sete anos não temos”. 

De acordo com Leonardo, tudo que ouve são apenas promessas, “promessas e mais promessas [que] são feitas pelo próprio governador que não as cumpre, e para piorar, mente para a população. Ele se orgulha da melhor polícia do país, mas nos trata como escória”, afirmou Leonardo.

(Cortesia de Leonardo Teles Cruz)

Repercussão e mobilização

As mobilizações anunciadas pelo Sindppen-MG tem repercutido em várias cidades do estado, incluindo Governador Valadares, Juiz de Fora, Unaí, Uberlândia, Belo Horizonte e Ipatinga. 

As manifestações e paralisações foram registradas nessas localidades, com ampla adesão dos policiais penais. “O estado inteiro aderiu”, afirmou Leonardo.

As manifestações têm sido pacíficas com os policiais penais exibindo faixas e cartazes que destacam as principais demandas da categoria. “A vida dos policiais civis não tem preço, mas seu trabalho tem! Governador Zema, cumpra com sua palavra. Recomposição salarial já!” dizia uma das faixas.

Operação legalidade

Como parte das ações de protesto, o sindicato decidiu iniciar “uma campanha pela legalidade”. Nesta operação, os policiais penais prometem seguir estritamente todas as normas e regulamentos mas apenas as normas e regulamentos, isso significa que os serviços que antes era sobrecarregado aos policiais deixaria de ser feito, sem realizar qualquer tipo de flexibilização ou concessão que costumeiramente ajuda a aliviar a sobrecarga do sistema penitenciário.

“E por isso na data de hoje decidimos, todas as classes da segurança pública, iniciarmos uma campanha pela legalidade, onde não mais ‘quebraremos o galho’ do estado, nossa operação legalidade pode parecer algo banal, porém trabalhando dentro totalmente da lei, o estado entrará em colapso com toda certeza uma vez que repito: não temos efetivo, infraestrutura, investimento e muito menos reconhecimento”, explicou Leonardo.

(Cortesia de Leonardo Teles Cruz)

Resposta do governo

Até o momento, o governo de Minas Gerais não se pronunciou oficialmente sobre a greve dos policiais penais. No entanto, em declarações anteriores, o governador defendeu as medidas de austeridade adotadas, alegando que são necessárias para equilibrar as contas públicas do estado.

Dados publicados pelo Governo de Minas Gerais pelo portal da transparência mostram que no ano de 2023 o total das receitas do governo estadual foi de R$110,71 bilhões. Ao mesmo tempo, o custo para pagar apenas os servidores estaduais de Minas Gerais chegou a R$70,562 bilhões.

Minas Gerais é o estado com maior número de municípios do Brasil, ao todo são 853 municípios, isso significa que o custo da alta cúpula do funcionalismo público é extremamente alto para o estado.

A greve dos policiais penais de Minas Gerais expõe a profunda crise enfrentada pelo setor de segurança pública no estado, porém não é exclusividade de apenas um setor, mas de um estado esgotado pelo endividamento. Desde 2019, o Governo de Minas busca solucionar a dívida deixada por governos anteriores. 

De acordo com uma publicação da Agência Minas Gerais, atualmente, a dívida pública estadual é de R$165,77 bilhões. Desse total, R$156,57 bilhões (94,4%) são valores devidos à União ou dívidas com instituições financeiras que tem a União como garantidora. 

Em encontro de governadores com o ministro Fernando Haddad, Zema questionou o modo em que o governo estava aumentando o valor das dívidas. “A correção de contratos entre entes federativos deveria ser feita pela inflação, mas o que estamos vendo é uma cobrança de taxa, às vezes, superior a que um banco cobra”, questionou.  

O governador também expôs uma consideração importante. “É a União cobrando de Minas Gerais, e isso é o que tem feito a dívida explodir. Só de juros são R$16 bilhões. E sem amortizar os mais de R$160 bilhões que ficaram intocados. Ano que vem, caso não venhamos a aderir à renegociação, vamos ter que desembolsar R$18 bilhões. Isso compromete o orçamento totalmente, pois nós não temos esse recurso”, concluiu Zema. 

O Epoch Times Brasil entrou em contato com o Governo Estadual de Minas Gerais mas não houve resposta ao pedido de comentário até o momento da publicação desta matéria.